segunda-feira, 1 de abril de 2013

S. João da Madeira: Público anónimo grava áudio-poemas para comunidade invisual


S. João da Madeira: Público anónimo grava áudio-poemas para comunidade invisual

Os visitantes da Feira do Livro de S. João da Madeira estão esta semana convidados a recitar para um gravador os seus poemas preferidos, que serão depois gratuitamente disponibilizados em áudio à comunidade com dificuldades de visão ou leitura.

A iniciativa enquadra-se no programa da campanha Poesia à Mesa e está aberta ao público em geral, sendo que os interessados podem gravar nas instalações da Feira do Livro poemas de sua autoria ou de escritores consagrados, com total liberdade de escolha quanto ao tema e ao estilo.
Rui Costa, vice-presidente da Câmara Municipal de S. João da Madeira, declarou à Lusa que essas gravações pretendem aumentar a oferta do Centro de Leitura Especial da Biblioteca Renato Araújo, que já disponibiliza áudio-livros e edições em braille, "a pensar não apenas na comunidade com deficiência visual, mas também em idosos e outras pessoas com dificuldades de leitura".
O objectivo é "dar oportunidade ao público e a alguns poetas da cidade de gravarem um poema dos seus ou uma obra já conhecida", sabendo que esse registo "será posteriormente incluído numa produção em áudio-livro e ficar disponível não só para quem utiliza o Centro de Leitura Especial, mas também para todos os utilizadores da biblioteca", no próprio edifício ou através da sua página de internet.
Vítor Ferreira é o técnico que está a coordenar as gravações numa sala mais isolada do edifício que acolhe a Feira do Livro e garante que só há um requisito exigido aos declamadores: "O importante é sentirmos o que estamos a dizer, pronunciarmos bem as palavras, respeitá-las correctamente. Não há assim grande segredo".
Também ele invisual, esse técnico afirma que os ficheiros áudio a transformar depois em mp3 para acesso generalizado pelo público se irão juntar a uma oferta editorial que, "felizmente, é cada vez maior".
"Nas livrarias não se vendem livros em braille, mas hoje também é possível encontrar lá áudio-livros e há cada vez mais pessoas - cegas e não só - a preferirem-nos", explica Vítor Ferreira.
"As instituições que produzem essa literatura - e há várias pelo país - tentam sondar um pouco o público, saber que necessidades existem, o que é que essas pessoas gostam de ler e, consoante essa solicitação, produzem de tudo um pouco", acrescentou.
Mara Martins é uma jovem de 14 anos e foi à Feira do Livro emprestar a sua voz a um poema, juntamente com vários outros colegas da Escola Secundária Oliveira Júnior.
"Acho que muitos jovens como eu têm sensibilidade para estas situações [da deficiência visual e dos problemas da idade]", defendeu na altura "foi um dos principais motivos para vir aqui".
A estudante admite que chegou a estar "um bocadinho nervosa" perante o equipamento de som, mas garante que foi só início: "A partir do momento em que comecei a ler, deixei-me levar e foi fantástico".
A sua escolha recaiu sobre um poema de Valter Hugo Mãe, que descobriu por recomendação de uma professora e em cujas palavras encontrou um tema que considera suficientemente abrangente para um registo áudio de difusão pública. "Fala de amor", explica Mara, "e eu penso que esse é um sentimento forte, que está presente em todo o nosso dia-a-dia".
Se é amargura ou realismo que se encontram nesses versos, a estudante de 14 anos não especificou. Limitou-se a proferir: "Prometo ser-te fiel se mo fores também. Não é certo que mo venhas a ser, por isso já to perdoo. Prefiro partir assim para o resto da vida, assim com olhos abertos à frustração e talvez à vulnerabilidade".
Fonte: Diário Digital com Lusa